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quinta-feira, 9 de maio de 2013

O infinito e a eternidad

 Olá,

Quê! Era verdade?
Outro universo descia em nosso rumo!
Milhões e milhões de sóis grupados planavam, novo arquipélago celeste, e se iam desenvolvendo qual vasta nuvem de estrelas, à proporção que subíamos.
 Tentei sondar com a vista, em torno de mim, em todas as profundezas, o Espaço infinito, e por toda parte avistei clarões análogos, montões de estrelas disseminados em todas as distâncias.



O novo universo em que penetrávamos era principalmente composto de sóis vermelhos, rubis e granadas. Muitos tinham absolutamente a cor do sangue.
Sua travessia foi uma verdadeira fulguração. Corríamos rapidamente de sol em sol, mas incessantes comoções elétricas nos atingiam, à semelhança dos clarões de uma aurora boreal.
Que estranhos estádios, esses mundos iluminados unicamente de sóis rubros!
Depois, em um distrito desse universo, notamos um grupo secundário, composto de grande número de estrelas cor de rosa e outras azuis.
De súbito, precipitou-se em nosso rumo, e nos envolveu, um enorme cometa, cuja extremidade dianteira semelhava uma goela colossal.
Aconcheguei-me com terror à ilharga da deusa, que durante um momento desapareceu da minha vista em luminosa névoa. Mas nos tornamos a encontrar em escuro deserto, pois que esse segundo universo se afastara igual ao primeiro.
– A Criação, disse-me ela, se compõe de um número infinito de universos distintos, separados uns dos outros por abismos de nada.
– Um número infinito?
– Objeção matemática, replicou.
 Sem dúvida, um número, por muito grande que seja, não pode ser presentemente infinito, pois que, pelo pensamento, se pode aumentá-lo sempre de uma unidade, ou mesmo duplicá-lo, triplicá-lo, centuplicá-lo. Lembra-te, porém, de que o momento atual não é mais do que uma porta por onde o futuro se precipita para o passado.
 A eternidade não tem fim, e o número dos universos será, ele também, sem fim.
 Além disso, as estrelas, os sóis e os universos não formam um número.
Eles são, por melhor dizer, sem número.
Olha! Vês ainda, sempre e por toda parte, novos arquipélagos de ilhas celestes, novos universos.
– Parece-me, ó Urânia, que há muito tempo já, e com grande velocidade, estamos subindo no céu sem limites!
– Poderíamos sempre subir assim, respondeu ela, sem jamais atingir um limite definitivo.
Poderíamos vogar para a esquerda, para a direita, para frente, para trás, para baixo, para não importa qual direção, e jamais, em parte nenhuma, depararíamos uma fronteira...
Nunca, nunca um fim.
 Sabes onde estamos?
Sabes que caminho temos percorrido?
Estamos... no vestíbulo do Infinito, tal qual o estávamos na Terra.
 Não temos avançado um único passo!
Grande comoção se apoderara do meu Espírito.
As últimas palavras de Urânia tinham-me penetrado até à medula, qual calafrio glacial.
 Nunca um fim, nunca, nunca! repetia eu. E não podia dizer, nem pensar outra coisa. Entretanto, a magnificência do espetáculo reapareceu a meus olhos e o aniquilamento cedeu lugar ao entusiasmo.
– A Astronomia! exclamei. É tudo!
 Saber estas coisas; viver no infinito. Urânia! Que é o resto das idéias humanas perante a Ciência! Sombras, fantasmas!
– Oh! disse ela, tu vais despertar na Terra, tu admirarás ainda, e legitimamente, a ciência de teus mestres; mas, fica sabendo: a Astronomia atual das suas escolas e dos observatórios, a Astronomia matemática, a bela ciência dos Newton, dos Laplace, dos Le Verrier, não é ainda a ciência definitiva.
“Não está lá, meu filho, o fim que busco desde os dias de Hiparco e de Ptolomeu.
Vê esses milhões de sóis análogos àquele que dá vida à Terra e, tal qual ele, fontes de movimento, de atividade e de esplendor; pois bem, é esse o objeto da ciência futura: o estudo da vida universal e eterna. Até hoje, não se há penetrado no templo.
Os algarismos não são um fim, mas um meio; não representam o edifício da Natureza, mas os métodos, os andaimes. Vais assistir à aurora de um novo dia. A Astronomia matemática vai ceder o lugar à Astronomia física, ao verdadeiro estudo da Natureza.
“Sim – acrescentou –, os astrônomos, que calculam os movimentos aparentes dos astros na sua passagem de cada dia pelo meridiano;
 os que anunciam a chegada dos eclipses, dos fenômenos celestes, dos cometas periódicos;
os que observam com tanta atenção as posições exatas das estrelas, dos planetas de vários graus da esfera celeste;
os que descobrem os cometas, os planetas das estrelas variáveis;
os que buscam e determinam as perturbações produzidas nos movimentos da Terra, pela atração da Lua e dos planetas;
 os que consagram suas vigílias à descoberta dos elementos fundamentais do sistema do mundo;
 todos, observadores ou calculistas, são os preparadores de materiais, precursores da nova Astronomia. São imensos trabalhos, labores dignos de admiração, transcendentes obras que põem em evidência as mais elevadas faculdades do espírito humano.
Mas é o exército do passado.  Matemáticos e geômetras.
 Doravante o coração dos sábios vai pulsar por uma conquista mais nobre ainda.
 Todos esses grandes Espíritos, estudando o céu, não têm, na realidade, saído da Terra. O fim da Astronomia não é mostrar a situação aparente de pontos brilhantes, nem pesar pedras em movimentos no Espaço, nem nos fazer conhecer com antecedência os eclipses, as fases da Lua ou as marés. Tudo isso é belo, mas insuficiente.
“Se a vida não existisse na Terra, este planeta seria absolutamente destituído de interesse para qualquer espírito que fosse, e a mesma reflexão se pode aplicar a todos os mundos, que gravitam em torno de milhares de sóis, nas profundezas da imensidade.
A vida é o fim da Criação inteira. Se não houvesse vida, nem pensamento, tudo isto seria como que nulo e não acontecido.
A Criação é um poema, do qual cada letra é um sol. Estás destinado a assistir a uma completa transformação da Ciência. A Matéria vai ceder lugar ao Espírito.”
– A vida universal! – disse eu –. Os planetas do nosso sistema solar serão todos habitados?... São habitados os milhares de mundos que povoam o infinito?... Essas Humanidades assemelham-se à nossa?... Conhecê-las-emos algum dia?...
– A época em que vives na Terra, a própria duração da Humanidade terrestre não é mais do que um momento na eternidade.
Não compreendi essa resposta às minhas perguntas.
– Nenhuma razão há, acrescentou Urânia, para que todos os mundos sejam habitados agora. A época presente não tem mais importância do que as precedentes ou as que se hão de seguir.
“A duração da existência da Terra será muito mais longa – talvez dez vezes mais longa – do que a do seu período vital humano.
 Em uma dezena de mundos, tomados ao acaso na imensidade, poderíamos, por exemplo, conforme os casos, achar apenas um atualmente habitado por uma raça inteligente.
Uns o foram outrora; outros sê-lo-ão no futuro; estes se acham em via de preparação, aqueles têm percorrido todas as suas fases; aqui, berços; além, túmulos; e depois, uma variedade infinita se revela nas manifestações das forças da Natureza, não sendo a vida terrestre de modo algum o tipo da vida extraterrestre.
 Seres podem viver em organizações inteiramente diversas das conhecidas no vosso planeta.
 Os habitantes dos outros não têm a vossa forma, nem os vossos sentidos. São outros.

URÂNIA                                        CAMILLE FLAMARION

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